No último dia 24 de novembro, discentes e o professor da disciplina de Educação em Direitos Humanos do Instituto de Ciência, Tecnologia e Inovação da Universidade Federal da Bahia realizaram uma visita de campo ao espaço Eco da Mata, localizado em Massarandupió, distrito de Entre Rios – Bahia A recepção ocorreu na Feira da Mata – referência em cultura, ancestralidade e economia solidária – e foi conduzida pelo historiador e um dos coordenadores, Prof. Dr. Tássio Simões Cardoso, que apresentou a dinâmica do evento.
Os organizadores da Feira da Mata nos receberam com uma exposição de livros e uma rica variedade de artesanato e gastronomia locais. A programação cultural teve início com Anna Kuia e Hermes Cerqueira, que realizaram um canto de boas-vindas para todos os visitantes. Em seguida, foi a vez do Toré, uma cerimônia conduzida pelos indígenas Tupinambá Gobi Bore, Flaizi e Tanawara que envolveu os presentes com danças e cânticos, reforçando a identidade e a espiritualidade, além de proporcionar um contato profundo com a terra.
A oficina de xilogravura, coordenada pelo poeta Luiz Natividade, encantou pessoas de todas as idades. O sarau foi marcado pela inspiração de poetas como Alan Silva e Boa Morte. Além de ser um espaço de expressão artística, a feira proporcionou momentos de reflexão, com o professor Dr. Alan Silva apresentou uma palestra sobre o papel da tecnologia no fortalecimento do desenvolvimento sustentável entre os povos tradicionais.
No palco livre, o discente Renan Cardoso participou do Sarau Encantos da Mata e declamou Vozes Mulheres, de Conceição Evaristo. O poema testemunha uma trajetória que se inicia no período da escravidão (representado pela bisavó) e se estende até os dias atuais (representados pela filha), projetando um futuro redentor de vida e liberdade para o povo negro, historicamente oprimido, desumanizado e tratado como propriedade pelos "brancos-donos de tudo".
Outro destaque da programação foi a Trilha Encantos Tupinambá, uma caminhada interpretativa no Ecoparque, conduzida pelo Prof. Dr. Tássio Simões Cardoso. Durante o percurso, foram apresentados territórios sagrados habitados por povos originários, onde ainda ocorrem diversos rituais. Um exemplo é o Wary, no qual os participantes permanecem até quatro dias na mata desconectados do mundo externo e vivenciando experiências únicas.
Entre as práticas oferecidas no Eco da Mata, destacam-se terapias voltadas para o corpo e a mente, como yoga, meditação, biodança, banho de argila e outras abordagens holísticas. Durante a trilha, foram apresentados também espaços como o Temazcal, a Roda Sagrada e o local dos cristais. Em um dos espaços de rituais, onde se realiza a consagração da medicina da floresta e o Toré, o professor Tássio reuniu os participantes para uma roda de conversa e um momento de reflexão, abordando os desafios socioambientais contemporâneos e o resgate da ancestralidade.
Ao retornar da Trilha Encantos Tupinambá, alguns discentes foram convidados a participar de um ritual com Rapé Shawãdawa, conduzido pelo biólogo Hermes Cerqueira. A acadêmica Leticia Gabrielly Simão da Silva relata sua experiência: “Pude conhecer o rapé, um tipo de medicina indígena usada para curar o corpo físico, que, ao ser inalado, traz a sensação de relaxamento e expansão da mente. Apesar do receio inicial, o rapé foi uma experiência muito boa e interessante, pois foram sensações quase indescritíveis, além de sentir uma forte conexão com a terra, leveza e relaxamento”.
Ao continuar expressando sua vivência no espaço sagrado, Leticia destaca: “Participar da visita à Feira da Mata foi uma experiência incrível, muito enriquecedora. Conhecer um pouco da cultura dos povos originários me trouxe o sentimento de pertencimento, pois minhas bisavós eram indígenas, então foi como se eu estivesse conhecendo a minha própria história. Muito grata pela oportunidade de fazer parte desse momento, espero voltar à Feira da Mata em outro momento”.
De acordo com o discente Gabriel Malheiros Munoz de Freitas, “foi uma viagem única e transformadora para todos os alunos, pois tivemos a oportunidade de vivenciar a rica cultura dos povos originários. Fomos recebidos com danças, músicas e lindos poemas que refletiam toda a beleza e a resistência dessa comunidade. Durante uma trilha fascinante, observei com atenção os detalhes e percebi como a interferência humana negativa afeta a vida de todos os animais. As experiências vividas na feira fortaleceram minha conexão com minhas raízes, e tenho certeza de que voltarei em outra oportunidade.”
O discente Mailson Piedade dos Santos destaca: “O sentimento é de gratidão. Essa é a palavra que define a incrível visita de campo ao Ecoparque e à Feira da Mata. Um espaço consolidado em seus saberes, fomentado pela cultura, preservação e união, seja quilombola ou indígena. Essa imersão nos permite destacar tudo aquilo que nos foi tirado. Em tempos de rotina controlada e acelerada, cheia de cobranças, barulhos e estresse, poder manter o contato olho no olho, sentir um ar mais puro e se desvencilhar das amarras de uma sociedade que impõe uma vida competitiva e sem conexão humana faz desse espaço algo de extrema importância para olharmos para dentro e descobrirmos que podemos ser mais, ser livres.”
Já Rayssa da Silva Santos enfatiza que “a visita de campo nos proporcionou emoções jamais adquiridas em sala de aula. Do Toré ao acarajé impecável e à trilha modesta na Mata Atlântica, foi possível sentir um pouco de cada detalhe da região, além da ótima receptividade por parte dos organizadores, em especial ao Prof. Dr. Tássio Simões Cardoso, que nos guiou do início ao fim nessa imersão na Feira da Mata. Gostaríamos também de agradecer ao Prof. Dr. Marcos de Souza pelo comprometimento com a nossa educação dentro e fora da sala de aula.”
O Prof. Dr. Marcos de Souza, docente da disciplina de Educação em Direitos Humanos, ressaltou a importância de os discentes vivenciarem na prática aspectos da cultura e das ancestralidades dos povos indígenas. Segundo o professor, no espaço acadêmico foram debatidos os Direitos Humanos dos Povos Indígenas e das Comunidades Tradicionais, com destaque para questões como legislações e o princípio da autodeterminação — um direito fundamental, reconhecido internacionalmente, que garante aos povos indígenas o poder de governar a si mesmos e tomar decisões sobre suas vidas, territórios, culturas e formas de organização social e política. No entanto, a visita de campo possibilita uma compreensão mais profunda da teoria debatida em sala. “Certamente, foi um momento ímpar na formação dos discentes, registrado em diversos momentos durante e após a Feira da Mata”, afirmou o professor.
Para o Prof. Dr. Tássio Simões Cardoso: “Foi uma experiência visceral de turismo pedagógico de base comunitária, no qual os estudantes, por meio do contato direto com os indígenas, quilombolas e feirantes, aprenderam novos conhecimentos, ampliando sua visão de mundo. Além disso, essa experiência contribuiu para que os estudantes pudessem se conectar com suas próprias ancestralidades, num movimento de descolonização do pensamento.” O encerramento do evento foi marcado com um banho no Rio Itibiuba.
Com informações de: Prof. Dr. Marcos de Souza e Prof. Dr. Tássio Simões Cardoso.